Dia 14 de Fevereiro, para muitos um dia de felicidade e troca de presentes. O Dia dos Namorados. Também eu já o festejei e foi dia de partilha de presentes com a minha actual esposa, mas não este ano. Neste ano de 2013 foi o dia em que o Mundo fugiu dos nossos pés e tudo pareceu ruir.
Depois de toda a ansiedade e receios anteriores aos exames e consultas, ao final do dia foi neste local que tudo pareceu real.
Ouvi a notícia sereno, talvez alienado da verdadeira realidade. Sem esboçar um rasgo de medo ou anseio, tristeza ou sentimento de ódio pela vida, levantámo-nos do consultório, marcamos as novas consultas e saímos do hospital em direcção a casa.
E foi aqui que não aguentei. Encostei-me a esta árvore, a minha esposa a mim e chorei, desabafei para o mundo. Coloquei em palavras e lágrimas tudo o que me ia na alma enquanto a neve caía e o frio me congelava a cara molhada pelas gotas de água que me caíam e que chegavam ao chão, já duras de gelo. Aquele tronco segurou-me e amparou-me na hora mais difícil da vida. Deu-me a força para enxugar os olhos molhados, pegar nas mãos da minha esposa e dizer que vamos conseguir, que vamos superar as dificuldades da vida juntos, pela nossa pequena filha e por nós. Deu-me energia para continuar o caminho para o nosso lar, para seguir em frente, e para a partir daquele momento falarmos abertamente do nosso problema e da doença que tinha sido diagnosticada à minha companheira de vida. Preciso de ser forte para lhe dar força a ela e é isso, que aqueles minutos, encostados aquela árvore me deram, a chorar e a congelar num dia de queda de neve forte. Foi provavelmente a melhor coisa que fiz inconscientemente.
Hoje, já com a operação realizada e com a perda física da amputação da minha companheira e amiga, gánhamos em amor, amizade e companheirismo para partilhar, entre nós, com a nossa filha e com futuros rebentos, que de uma maneira ou de outra havemos de criar. Estamos prontos, sempre prontos para o passo seguinte.
O Cancro é, para além de uma doença que nos pode transformar fisicamente, com uma (im)provável cura que é dura, doentia e extenuante, é também uma doença que nos ataca psicologicamente como uma seta que atravessa a pele e nos esventra as entranhas. Que nos tira o chão debaixo dos pés e nos coloca nos ombros o peso do Mundo. Os doentes de Cancro sofrem, mas quem com eles está também, mas mais calados, mais silenciados para que tenham sempre a força necessária para partilhar com a sua amada. Mas estamos orgulhosos do nosso bem-estar mental que atingimos. Não nos escondemos, sempre falamos abertamente sobre o assunto, sempre como se fosse a coisa mais natural da vida, que em certa maneira até será, pois as dificuldades e as más surpresas fazem parte dela.
Depois disto passar, de vencer e retomar o caminho que traçamos, prometo aqui a quem ler e em pensamento aquela árvore, que coloco uma vela junto daquele "pilar" para que outros que possam vir a precisar, terem a luz de um local que os possa amparar e segurar, tal como nos fez a nós. As tuas raízes seguram-te ao chão, os teus ramos parecem segurar os céus, mas foi o teu corpo que me segurou e aqueceu naquele dia branco, frio e de neve.
Alvaro Faustino, casado com uma lutadora contra um Cancro de Mama.